Memória viva

Governos espertos olham, em primeiro lugar, para o emprego e a renda. E procuram reger as demais variáveis em função das duas. Mas, e a inflação? A verdade é que a América Latina já esqueceu dela. A memória mais recente é a da estagnação

Cristina Kirchner venceu com folga o desafio reeleitoral, por uma razão simples, bem conhecida e já muito tratada, inclusive aqui. Na comparação com os antecessores, os governos Kirchner têm sido paradigma de eficência, desenvolvimento e preocupação social.

Lá, como cá, o desejo de não retornar ao passado ajudou Cristina. A ponto de ela obter votação recorde.

A Argentina tem seus problemas, com destaque para a fragilidade institucional. Ninguém sabe direito a quantas anda a inflação, aliás falar disso costuma dar dor de cabeça para os jornalistas dali. Pois os preços ali correm rápido.

E as convicções democráticas do casal Kirchner nunca foram uma brastemp.

Mas a economia cresce, gera empregos, há sinais de reindustrialização e a percepção social é que o kirchnerismo defende o país e os mais pobres. Ainda que as nuvens adiante estejam carregadas.

O momento fundador dessa percepção foi a denúncia da dívida externa, lá no começo do governo de Néstor.

Nascida do caos social e político provocado pelo colapso econômico, a necessidade da moratória se impôs, por cima de todas as advertências, ameaças e exibições de dentes.

A Argentina simplesmente não teria como sair do buraco sem ignorar uma parte dos compromissos financeiros. Ou até teria, a um custo social proibitivo.

Mais ou menos como a Grécia agora. A desvantagem dos gregos é fazerem parte de uma união monetária.

E o mais interessante foi a Argentina ter dado o passo no auge da deificação das “ideias certas”. Por exemplo a que prega a santidade e a imutabilidade dos contratos.

Uma ideia muito querida dos ideolólogos do empresariado, ainda que o empresário mesmo, o de raiz, nunca hesite quando denunciar um contrato é bom para o negócio dele.

Eu pelo menos nunca conheci nenhum que aceitasse levar a empresa à falência para honrar um mau contrato.

Os argentinos impuseram aos credores um forte desconto na dívida e não aconteceu nada. O dinheiro continuou chegando, engordando e indo embora, como sempre fizera antes. E como continuará fazendo desde que lhe garantam as necessárias condições de reprodução.

Argumentarão que a Argentina precisou pagar caro para compensar o maior risco.

E quem somos nós para dizer isso?

Aqui se produz todo ano um belo superávit primário. Um pouco mais, um pouco menos, mas sempre belo. Aqui vigora uma Lei de Responsabilidade Fiscal bastante rígida. E aqui a transparência das contas públicas é exemplo para outros países.

Tudo muito bonito.

E mesmo assim pagamos o maior prêmio do mundo a quem traz dinheiro para cá. Nossa taxa real de juros não tem concorrente. Pelo ângulo da engenharia reversa da precificação do risco, talvez sejamos, no fim das contas, um lugar bastante arriscado para investir.

Por incrível que pareça.

Se pagamos juros tão elevados é porque a coisa não vai tão bem assim. Do contrário não precisaríamos remunerar tão maravilhosamente quem traz o dinheiro.

Como curiosidade, os Estados Unidos, que estão na draga, pagam juro tendente a zero e mesmo assim qualquer marolinha planetária provoca um tsunami a favor dos títulos do Tesouro americano. E não contra.

Ainda que esse detalhe possa enfraquecer o argumento central da coluna, pois um trunfo dos Estados Unidos é a garantia pétrea de que honrarão seus compromissos.

A realidade é mesmo contraditória.

Vindo para a economia doméstica, a reeleição de Cristina Kirchner explica bem por que a colega do lado de cá da fronteira sustenta a política de redução de juros agora praticada pelo nosso Banco Central. Uma política agressiva, nas circunstâncias.

Governos espertos olham, em primeiro lugar, para o emprego e a renda. E procuram reger as demais variáveis em função das duas.

Mas, e a inflação? A verdade é que a América Latina já esqueceu dela. A memória mais recente é a da estagnação.

Com as devidas consequências políticas.

(Original aqui.)

Juros e política

(Comentários ao final.)

A reunião do Copom esta semana será a mais difícil do governo Lula. Houve outras que foram verdadeiros testes de autonomia do Banco Central. Nesta, os rumores de que o presidente do BC pode se afastar para retomar a carreira política e as pressões contra a alta dos juros por causa do “calendário cívico” alimentam as dúvidas sobre o que acontecerá.

Os analistas estão divididos. O Itaú Unibanco acredita que os juros vão subir 0,5 ponto percentual. O Bradesco também acredita em um aumento de 0,5 ponto percentual. A Tendências acha que os juros não vão subir em março, só em abril. A MCM também aposta que os juros vão subir só em abril, mas acha que o certo seria subir agora.

O economista José Júlio Senna, da MCM, analisando novamente as atas dos momentos críticos, disse que o BC só muda a trajetória dos juros depois de uma ata forte. Foi assim em 2007, quando parou de reduzir os juros; em 2008, quando elevou as taxas; e em 2009, quando voltou a cortar. Por isso, acha que o BC vai elevar o tom nesta ata e subir juros só na próxima. Mas não acha que isso seja o melhor:

— Pelo cenário atual, o recomendável seria subir juros já na quarta-feira. Do contrário, teremos 45 dias de piora das expectativas — disse Senna.

O Banco Central do Brasil não é autônomo. Ele tem tido autonomia. Nos grandes testes, o Copom acabou decidindo — certo ou errado — mas contrariando pressões explícitas da Fazenda e outros setores do governo.

Pelo manual das metas de inflação, há motivos para subir os juros: a inflação pelo IPCA acumulada em dois meses é de 1,54%, um terço da meta, e é o que o Banco Central, em dezembro, tinha projetado para todo o primeiro trimestre. A projeção da Ativa Corretora para o IPCA acumulado no trimestre é de 2%. O IGP-DI, que terminou o ano com deflação, em dois meses acumulou 2,11%. O Boletim Focus, que traz a projeção média do mercado, já prevê 5% de inflação no ano.

Recentemente, o presidente do BC, Henrique Meirelles, disse que as decisões não são tomadas olhando-se o “calendário cívico”. O texto dessa declaração foi preparado por ele mesmo, e não por assessores. Ele leu e não deu entrevistas. Era aquilo mesmo que queria dizer. No outro dia, no entanto, o ministro Guido Mantega disse que não era exatamente aquilo que Meirelles quisera dizer.

Até hoje Meirelles tem de fato ficado imune ao calendário político, mas o que acontecerá se em seus planos estiver o de se afastar em abril para concorrer nas eleições deste ano?

Há quem se pergunte se será possível ao BC iniciar um ciclo de aumento das taxas, o que significa elevar a cada reunião um pouco, apesar da tensão que isso vai causar no governo por causa da campanha eleitoral.

Preços em alta sempre pioram o humor do eleitorado; juros crescentes sempre pioram o humor dos políticos, empresários e dos que dentro do governo acham que o Banco Central tem sido conservador demais. Esse será o dilema nesta e nas próximas reuniões do Copom.

Se Meirelles sair, uma equipe mais dócil pode acabar evitando a elevação das taxas, e isso poderia realimentar a inflação. Se ficar, certamente continuará apostando tudo na manutenção da inflação baixa para manter a reputação de independente.

O Itaú Unibanco acha que os juros sobem meio ponto, e já esta semana.

— O Copom vai iniciar na próxima reunião uma série de elevações graduais da taxa. Acreditamos que serão quatro aumentos consecutivos, que começará por meio ponto percentual na próxima reunião e vai somar 2,75 pontos ao longo de toda a série. Ao fim desse movimento, na reunião de julho, a Selic estará em 11,5% ao ano — disse Ilan Goldfajn.

Os que acreditam que o aperto virá mais à frente argumentam que a economia vai desacelerar naturalmente do nível anualizado que mostrou no quarto trimestre, de 8%. Esse ritmo não se sustentaria, porque foram retirados os estímulos econômicos de combate à crise, e o comércio mundial continuará fraco e servirá de freio ao crescimento do país. Além disso, a inflação deste começo de ano foi influenciada por fatores sazonais, como ônibus e escolas, que não vão afetar os outros meses.

A Tendências Consultoria acha que os juros não sobem agora em março, mas que em abril começa o ciclo de alta, que vai elevar em 2,5 ponto percentual os juros.

— O crescimento do quarto trimestre do ano passado foi pautado pela reocupação da capacidade ociosa, dos incentivos ao consumo. Isso não vai se repetir ao longo do ano. Além disso, o mercado externo não se recuperou totalmente — explicou o economista Bernardo Wijuniski.

Eu acho bem provável que o Banco Central aumente, mas apenas 0,25%, dando um sinal de que é o início de um ciclo de aperto monetário. Se esse ciclo ocorrerá e será longo, isso quem vai dizer é a queda de braço entre a política e a economia. Se o BC quiser subir juros, é preferível subir logo porque a campanha ainda não esquentou. Depois virá a Copa, em que o Brasil pouco se importará com juros. Se as taxas subirem agora, em setembro e outubro é que elas estarão derrubando a inflação. Será uma forma de atender, sem parecer que está atendendo, ao calendário cívico.

(Original aqui.)

Comentário: É inegável que o Banco Central conseguiu, no governo Lula, ser relativamente independente em relação à esfera política, deixando claro que a condução econômica do país é uma, e a condução política é outra. Mas isso foi “fácil” quando o governo era um só — no sentido de que não havia preocupações com o fim do governo Lula. Neste ano será diferente: seja lá quem ganhe, o presidente não será mais Lula com seu carisma a sustentar a ideia de inflação baixa para a população. Há o perigo dos “desenvolvimentistas” ganharem espaço na condução da política econômica brasileira, e eu pessoalmente acho isso péssimo porque indica o retorno da inflação — é a ideia de que “é bom ter uma inflação um pouco mais alta, desde que o crescimento seja mais alto — , e eu discordo efusivamente disso. De todo jeito, minha esperança é a de que os aumentos nos juros comecem agora, evitando-se um repique da inflação no meio do ano — período de Copa do mundo no qual, como dito no texto, ninguém está nem aí para nada.

… E Lula fala

Abaixo coloco reportagem do portal G1 a respeito de entrevista que o presidente Lula deu ao Jornal do Brasil. Interessante ver os posicionamentos e as “desculpas” dadas pelo presidente para alguns atos que chocaram muitos de seus eleitores, como o apoio ao senador José Sarney e o abraço sorridente a Fernando Collor de Melo. Da mesma forma, é interessante e importante notar o comportamento do presidente a respeito da ministra Dilma Rousseff.

Cristo teria que se aliar a Judas no Brasil, diz Lula para jornal
Presidente deu entrevista em que fala sobre alianças políticas.
Lula chamou de correta a classificação de ‘marolinha’ sobre a crise.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que “no Brasil, Jesus teria de fazer aliança com Judas”, em entrevista para o jornal “Folha de S.Paulo” desta quinta-feira (22), se referindo aos acordos eleitorais.

“Nunca me senti incomodado. Nunca fiz concessão política. Faço acordo. Uma forma de evitar a montagem do governo é ficar dizendo que vai encher de petista. O que a oposição quer dizer com isso. Era para deixar quem estava. O PSDB e o PFL (hoje DEM) queriam deixar nos cargos quem já estava lá. Quem vier para cá não montará governo fora da realidade política. Se Jesus Cristo viesse para cá, e Judas tivesse a votação num partido qualquer, Jesus teria de chamar Judas para fazer coalizão”.

Na mesma entrevista, Lula também falou sobre vários outros assuntos, como as eleições de 2010 e a crise econômica.

Dilma

Segundo o jornal, Lula defendeu a escolha de Dilma Rousseff, ministra da Casa Civil, como candidata do PT para 2010. “Dilma é a mais competente gerente que o Estado brasileiro já teve. A capacidade de trabalho da Dilma, a competência, o passado político e o presente, me faz garantir que a Dilma é uma excepcional candidata a presidente da República. (…) Tem firmeza ideológica, tem compromisso, tem lealdade, sabe de que lado está”. E garantiu: Dilma está “muito preparada” para ser presidente.

Em resposta aos que dizem que Dilma eleita equivale ao seu terceiro mandato, Lula disse que “é exatamente o contrário. Uma mulher que tem a personalidade que a Dilma tem. Conheço bem a personalidade dela. Isso vai exigir que eu tenha o bom senso de quando elegi o Jair Meneguelli presidente do sindicato de São Bernardo, o José Dirceu presidente do PT. Rei morto, rei posto. A Dilma no governo tem de criar a cara dela, o estilo dela, o jeito dela de governar”.

Lula explicou na entrevista o acordo entre PT e PMDB para 2010. “Patrocinei uma reunião de líderes do PT com o PMDB, que fizeram uma nota. Haverá um acordo nacional, e a chapa será PT-PMDB”. Sobre Michel Temer ser o vice nesta chapa, ele disse: “Não posso dar palpite. Quem discute vice é o candidato a presidente”.

O presidente falou sobre os possíveis candidatos à presidência em 2010. “Na política, tudo pode acontecer. O Ciro [Gomes, deputado do PSB-CE] tem todas as condições de ser candidato a presidente. Sou um homem feliz. Feliz desse país, que tem o Ciro, a Dilma, o Serra [José Serra, governador de São Paulo, do PSDB], o Aécio [Neves, governador de Minas Gerais, também do PSDB], a Marina [Silva, senadora pelo PV], a Heloísa Helena [senadora do Psol]. Nesse espectro, não tem ninguém de extrema-direita ou conservador ao extremo. Todos têm história. Não acho que é mérito meu, não. Fernando Henrique Cardoso tem importância nisso, pelo fato de ter feito comigo uma transição excepcional”.

Oposição

Sobre as críticas feitas por Serra ao seu governo, Lula se defendeu. “Quando se é oposição, você acha, pensa, acredita. Quando é governo, faz ou não faz. Toma decisão. O Serra participou de um governo oito anos. Tiveram condições de tomar decisões e não tomaram. Obviamente, qualquer um que for presidente, tem o direito de tomar a posição que bem entender. É como jogador bater pênalti. Brincando todo mundo marca gol. Na hora do pega para capar, até pessoas como o Zico e o Sócrates perderam pênalti” disse Lula.

Lula falou ao jornal sobre ter um governo popular e a oposição liderar nas pesquisas. “Lógico que é recall. O fato de ter um candidato da oposição que é governador de São Paulo, já foi candidato a presidente, que já foi senador, que já foi ministro, tem uma cara muito conhecida no Brasil inteiro. Obviamente, a transferência de voto não é como passe de mágica. Vamos trabalhar para que a gente possa transferir todo o prestígio angariado pelo governo e pelo presidente para a nossa candidatura”.

Sobre temer uma uma chapa Serra-Aécio, o presidente responde com voz firme: “Não”. E perguntado sobre ter pedido a Aécio para ele não ser vice de Serra, Lula sorri e continua: “Não, não”.

Segundo o jornal, Lula defendeu as viagens em que aparece acompanhado de Dilma e chamou de “debate pequeno” a acusação de campanha antecipada. “Você passa o tempo inteiro plantando a sua rocinha. É justo que, quando ela ficar no ponto de colher, você vá colher. Foi grande o sacrifício que fizemos para o Brasil voltar a investir em infraestrutura. (…) Ninguém pode ser contra a Dilma ir às obras comigo. Até porque, se ela for candidata, a lei determina quem tem prazo em que ela não poderá mais ir. Até chegar lá, ela é governo. É um debate pequeno”.

Sarney e Collor

Perguntado pelo jornal sobre não ter abandonado o senador José Sarney (PMDB-AP) durante a crise do Senado, Lula disse que foi por “uma razão muito simples. O PT teve candidato a presidente do Senado, derrotado [Tião Viana, do Acre]. Não entendi porque os mesmos que elegeram Sarney, um mês depois, queriam derrubá-lo. Coincidentemente, o vice não era uma pessoa (Marconi Perillo, PSDB-GO) que a gente possa dizer que dá mais garantia ao Estado brasileiro do que o Sarney. A manutenção do Sarney era questão de segurança institucional. O Senado está calmo. Está funcionando. Qualquer cidadão pode perder a cabeça, um presidente da República não pode perder a cabeça”.

O presidente continua: “A queda do Sarney era o único espaço de poder que a oposição tinha. Aí, ao invés de governabilidade, iam querer fazer um inferno neste país. Foi correta a decisão de manter o Sarney no Senado”.

Sobre quem admira vê-lo abraçado com Fernando Collor, Renan Calheiros, Jader Barbalho ou Sarney, o presidente disse que “o cidadão que admira o Lula tem de saber que essas pessoas foram eleitas democraticamente. E o eleitor dessas pessoas é tão bom quanto ele”.

Lula disse não ter mágoas da campanha de 1989, quando concorreu à presidência contra Collor e perdeu. “Minha relação com o Collor é a de um presidente da República com um senador de um partido que faz parte da base da base. Os senadores do PTB têm votado sistematicamente com o governo. Não tenho razão para carregar mágoa ou ressentimento,” garantiu Lula.

Crise

Segundo o jornal, Lula chamou de correta a classificação de “marolinha” da crise que gerou desemprego e derrubou o crescimento da economia de 5% ao ano para 1% em 2009 em cenário mais otimista. “Foi correto. Temos que separar a crise em dois momentos. Até setembro de 2008, discutíamos a crise do subprime quando ainda não havia o problema dos bancos. (…) Quando veio o Lehman Brothers [quebra do banco americano de investimentos em setembro de 2008], aconteceram duas coisas graves. O dinheiro desapareceu. Uma empresa como a Petrobras passou a pegar empréstimos na Caixa que seria destinado a pequenas empresas brasileiras”.

Segundo o presidente, “as coisas não aconteceram aqui como em outras partes do mundo porque nós tomamos medidas imediatas. (…) Nos debates com empresários, a minha inconformidade é que houve no mês de novembro e dezembro uma parada brusca desnecessária de alguns setores da economia”.

Lula criticou ao jornal a atitude do setor empresarial, tendo como exemplo a Vale, a Embraer e os bancos privados que secaram o crédito. “Foi precipitação do setor empresarial, que deveria ter tido tido a tranquilidade que o governo teve. Deveriam ter ouvido o pronunciamento de 22 de dezembro em que fui à TV contraditar a tese de que as pessoas não iam comprar com medo de perder o emprego. Fui dizer que iam perder emprego exatamente se não comprassem”. Perguntado sobre ter comprado algo durante esta período, o presidente respondeu: “Lógico. Comprei geladeira nova”.

Sobre governar para todos, pobres e ricos, ele disse que “a burguesia [brasileira] era a que que sempre foi, a burguesia que está sempre querendo mais. Da minha parte, não existe preconceito. Tenho consciência de que estão ganhando dinheiro no meu governo como nunca”.

Juros

Com o dólar no patamar de R$ 1,70 e juros ainda altos na comparação com outros países, ele falou ao jornal sobre não temer viver uma crise cambial em 2010 ou deixar uma bomba-relógio para o sucessor. “Nunca trabalhei com juros altos tendo como parâmetro outros países”, disse. Lembrado que os juros no Brasil são altos e que sempre reclama disso. “Sei. Mas trabalho na comparação com o que era. Em vez de ficar achando que a calça do outro é apertada, eu vejo a minha de manhã. O Brasil tem a menor taxa de juros de muitas décadas”.

Lula disse acreditar que a taxa básica poderia estar mais baixa. “Poderia. Mas, descontada a inflação, temos 4%, 4,5% de juro real. Há muitas décadas o Brasil não tinha esse prazer. O problema hoje é o spread bancário, que ainda está alto, e o governo tem trabalhado para reduzir”.

IOF e IPI

Lula explicou na entrevista a decisão de taxar IOF da entrada de capitais estrangeiros no país. “Antes que aconteça uma superentrada de dólares no Brasil, reduzindo muito o valor do dólar em relação ao real, criando problema na balança comercial, e com algumas empresas exportadores tendo problema, nós demos um sinal com o Imposto sobre Operações Financeiros (IOF), que passou a ser cobrado no ingresso de capitais. Demos um sinal para ver se a gente equilibra,” disse.

Segundo o jornal, especialistas dizem que a medida será inócua. “Se for inócuo, mudamos. Há uma disputa. O setor produtivo totalmente favorável, e o financeiro totalmente contrário. Isso é importante, porque significa que o governo está no caminho do meio, e aí é mais fácil a gente acertar”, completa o presidente.

Lula não quis confirmar se haveria prorrogação da isenção de IPI para a linha branca. “Essas coisas a gente não diz sim ou não com antecedência. Se eu disser agora que vai ser prorrogado, as pessoas que iam comprar agora deixam de comprar”. Peguntado se tem simpatia pe prorrogação, Lula respondeu: “Tanto que tenho simpatia que fiz a desoneração”.

Poupança e Restituição

Lula confirmou na entrevista que o governo vai enviar ao Congresso o projeto para cobrar IR de poupanças acima de R$ 50 mil. Mas ressaltou que “poderemos discutir outras bases”.

Lula falou ainda sobre sua ordem para normalizar o pagamento da restituição do IR. “Não havia nada de anormal. No Brasil, já tivemos momentos em que a devolução atrasou. No nosso governo, tivemos momentos em que adiantou. Tem que pagar. Nós precisamos de consumo. Precisamos que o povo tenha dinheiro para comprar. Falei com o Guido [Mantega]: Guido, nós precisamos que o povo tenha dinheiro para comprar. O povo tem de ter o dinheiro em dezembro”.

Imprensa

Lula falou também sobre o papel da imprensa. “Como presidente, nunca fico incomodado. Não acho que o papel da imprensa é fiscalizar. O papel é informar. Para ser fiscal, tem o Tribunal de Contas da União (TCU), a Corregedoria-Geral da República, tem um monte de coisas. A imprensa tem de ser o grande órgão informador da opinião pública. Essa informação pode ser de elogios ao governo, de denúncias sobre o governo, de outros assuntos. A única que peço a Deus é que a imprensa informe da maneira mais isenta possível, e as posições políticas sejam colocadas nos editoriais”.

(Original aqui.)